Os sinos dobram por nós
"No man is an island, entire of itself; every man is a piece of the continent, a part of the main. If a clod be washed away by the sea, Europe is the less, as well as if a promontory were, as well as if a manor of thy friend's or of thine own were. Any man's death diminishes me, because I am involved in mankind; and therefore never send to know for whom the bell tolls; it tolls for thee..."
John Donne
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Pegou a moda das colunas n’O Insurgente. Como não sou tão audaz quanto queria, avanço depois de alguns já o terem feito. No entanto, porque a originalidade é uma coisa muito bonita e o receio de falhar maior ainda, esta só será publicada às quartas-feiras, de 15 em 15 dias. Juntando o útil ao agradável, manterei a minha colaboração regular de comentários mais breves. Os sinos dobram por nós e é nossa responsabilidade estarmos sempre atentos. Peço desculpa pela crueza que estas crónicas eventualmente possam conter, mas é assim que vejo a coisa.
Syriana
O filme Syriana é daqueles que gosto. Político, confuso, cheio de historietas e meias palavras repletas de mentiras e um niquinho de verdade. Parece que a desconfiança voltou e o cinema tem saudades dos anos 70. Isto é bom. É divertido e dá azo a algumas discussões.
A autocrítica é exemplar, mas deixa de ser digna quando se limita às palavras. É fácil fazer um filme a expor as maldades dos nossos governos e a forma atroz como tratamos os outros povos. Em Syriana, as empresas petrolíferas norte-americanas sugam ao tutano os príncipes árabes. Até aqui nada de mais. O que me espanta é a comoção que a história causa. O Ocidente esqueceu que para levar a vida que tem é preciso ser mauzinho e como nem todos temos estaleca para isso, alguém o tem de fazer por nós. Homens de negócios em fatos escuros imaculadamente limpos a transpirar dólares (e euros) por todos os poros, soldados de arma em punho a vigiar locais estratégicos, como canais e estreitos, por onde passam as nossas matérias primas. Somos os únicos que o fazemos? Não. Somos, por enquanto, os únicos com força para o levar a cabo. Se não o pedirmos aos ‘nossos’ homens, ‘outros’ o farão. Ou será que ainda não saímos da idade da inocência e achamos que os chineses não têm interesses, mas apenas boas intenções? Cá pelo burgo, chamado Portugal, onde nos limitamos a receber e a pouco contribuir, dizer mal é fácil. Orgulho, orgulho, apenas na história e nos antepassados que já pouco mal fazem. Ademais, a ignorância dá imenso jeito nestas ocasiões, ajudando a esquecer que, comparado connosco, os marines são uns meninos.
A verdade é dura e brutal, mas alguém tem de fazer o jogo sujo. Se assim não fosse, ontem não tinha sido carnaval, nem a quarta-feira de cinzas era apenas hoje, mas sempre. A folia nem sequer tinha começado. A autocrítica é louvável, mas chorar lágrimas de crocodilo não é digno.
por André Abrantes Amaral @ 3/01/2006 11:27:00 da manhã
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