Reino dos Céus
Ridley Scott realizou um filme sobre as Cruzadas chamado Kingdom of Heaven. Obviamente ainda não vi o filme (e não sei se o verei), mas daquilo que li, inclusive as entrevistas com o realizador, parece-me que vai sai mais uma chachada politicamente correcto.
Mas, hoje, o Jornal de Notícias, tem dois textos de crítica assinados por Manuel Menano que, sinto, se chegar a ver o filme, não poderei estar mais de acordo, até porque aquilo que ele diz dos exemplos citados é absolutamente correcto.###
Alguns excertos do primeiro texto, Proto-democracia em épocas de cruzdas: "Reino dos céus", de Ridley Scott, é um épico passado durante as cruzadas do séc. XII, que relata a luta entre muçulmanos e cristãos pelo reino de Jerusalém. Além da análise histórica, o filme tenta um outro ganho fazer a ponte da temática para a actualidade.
O outro texto, O épico pelas ruas da amargura:
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Baseado em figuras históricas reais, "Reino dos céus" é outro épico de acção cujas cenas de batalha, com mais ou menos efeitos digitais à mistura, são em si mesmas meio e fim de toda a sua densidade dramática, à semelhança dos recentes "Tróia" ou "Alexandre"- até o elenco de luxo mais não é que mero acessório.
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Depois, tal como o fizera em "Gladiador", Scott cai no mesmo erro de criar um discurso modernaço de democracia e tolerância, que tem pouco cabimento numa época onde a chacina era, de parte a parte, a palavra de ordem. Maximus falava da grandeza de Roma e do sistema senatorial à população do Coliseu; Balian promove o diálogo entre religiões. "O Sepulcro não é mais importante do que o Muro ou a Mesquita!", diz a um mar de camponeses, antes de os ordenar a todos cavaleiros, com as tropas de Saladino às portas da cidade. Para capitalizar no filão, massificaram-se os argumentos, copiaram-se os piores defeitos (como o ridículo discurso de valores pós-modernos), e a qualidade desceu a pique, bem como o público. Só no ano passado, estrearam "Tróia", de Wolfgang Peterson, "Rei Artur", de Antoine Fuqua, e "Alexandre", de Oliver Stone.
De facto, todos estes filmes épicos mais recentes acabam por ser bastante ridículos, pois transportam para séculos passados conceitos que lhes eram completamente estranhos. É lógico que quem faz um filme, não faz uma reconstituição histórica, mas quem o vê (pelo menos com olhos de ver) não deixa de sentir ridículos discursos grandiloquentes (em Alexandre, o rei macedónio faz um discurso antes da batalha perfeitamente incongruente com quem estava a entrar em guerra apenas para construir um império).
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Longe vão os tempos de "Spartacus", "Ben-hur", ou "Lawrence da Arábia". Hoje não há um Kirk Douglas, um Charlton Heston, Peter O' Toole ou Errol Flynn que dê alma a objectos essencialmente inanimados, politicamente correctos, e historicamente risíveis. Onde os heróis, ora andróginos ora anabolizados, são todos metrosexuais [sic], onde na Idade Média se fala em democracia e as mulheres são guerreiras respeitadas, onde se luta pela liberdade mais do que pela sobrevivência. É também aí que habita "Reino dos céus". Onde o épico tão cedo não deixará de andar pelas ruas da amargura.
E é isto que me incomoda (incomodar se calhar é uma palavra muito forte, porque tenho sempre remédio: não vejo os filmes) em muito filmes de Hollywood sempre prontos, umas vezes subrepticiamente outras nem tanto, a passar mensagens do pensamento único politicamente correcto (sobre feminismo, homossexualidade, imigração, relações internacionais ou entre religiões, etc.) de uma agenda "liberal" (no sentido anglo-saxónico do termo, é claro). E isto acontece praticamente em todos os tipos de filmes.
por Rui Oliveira @ 5/05/2005 02:37:00 da tarde
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