12.9.06

Interesse público a 212 km/h

A propósito do caso do excesso de velocidade da viatura oficial do Ministro Manuel Pinho, a ACA-M acaba de endereçar ao Senhor Director-Geral de Viação o Requerimento abaixo, considerando que este é o autor moral da infracção muito grave cometida pelo motorista da viatura.

Exmo. Senhor Dr. Rogério Pinheiro
Director-Geral de Viação
Av. República, 16
1000 Lisboa

Ass: Requerimento

Exmo. Senhor,

Vem a Associação de Cidadãos Auto-Mobilizados (ACA-M), em defesa do interesse público, reportar-se à infracção muito grave cometida pelo motorista da viatura oficial utilizada pelo Dr. Manuel Pinho, Ministro da Economia e Inovação, no passado dia 9/09/06, quando se deslocava na A1, no sentido Lisboa-Porto, infracção essa identificada pelos radares da GNR-BT na zona de Leiria.

Esta infracção muito grave – a viatura circulava à velocidade de 212km/h, como foi amplamente difundido pela comunicação social – terá sido justificada publicamente pelo Ministro por motivo de “serviço urgente de interesse público”.

Ora, considera a ACA-M que esta justificação não tem fundamento, já que o interesse público (aparentemente, uma banal reunião com o autarca de Matosinhos) é manifestamente inferior aos vários prejuízos decorrentes da infracção.
Designadamente porque:
  1. a circulação à velocidade de 212 km/h coloca em manifesto perigo de vida os restantes utentes da via;
  2. prejudica – descredibilizando-a - a política governamental de combate ao excesso de velocidade, considerado como a principal causa de sinistralidade rodoviária pelo Ministério da Administração Interna;
  3. prejudica também a política governamental de redução de emissão de gases para cumprimento do protocolo de Quioto, que estabelece a diminuição do limite máximo de velocidade em auto-estrada;


A circulação à velocidade de 212 km/h é qualificável como comportamento anti-social, e a invocação, neste caso, de “serviço urgente de interesse público” não é legítima, desvirtuando as intenções do legislador.

Não deverá V. Exa. deixar de considerar que o motorista da viatura oficial não circularia à velocidade referida não fora por indicação expressa do Senhor Ministro Manuel Pinho.

Notamos, por isso, que o artigo 26º do Código Penal, que se aplica subsidiariamente ao caso sub judice, estatui que é punível como autor não só quem executar o facto mas ainda quem, dolosamente, determinar outra pessoa à prática do facto” o que caracteriza a figura jurídica da instigação e autoria moral.

No mesmo sentido vai o artigo 135 nº 7 a) do Código da Estrada, ao estatuir que “Os comitentes que exijam dos condutores um esforço inadequadao à prática segura da condução” são também responsáveis pelas infracções previstas no Código da Estrada.

Assim, não se pode punir unicamente, como autor do facto ilícito praticado, o motorista do Ministro da Economia, pelas seguintes razões:
  1. Encontrava-se no exercício das suas funções;
  2. Sob autoridade e direcção directa do ministro;
  3. O interesse de chegar mais cedo ou mais tarde ao destino das alegadas funções oficiais, era do ministro e não do motorista o qual agiu, obviamente, por ordem expressa ou tácita do seu comitente – o Ministro da Economia.


Assim, terá que se concluir que a contra-ordenação muito grave e, eventualmente, o crime praticado, são da responsabilidade do Ministro da Economia e não apenas do seu motorista, pelo que vimos requerer que a sanção a aplicar ao motorista seja extensível ao Senhor Ministro.

Pede Deferimento,

Manuel João Ramos
Presidente da Associação de Cidadãos Auto-Mobilizados

Lisboa, 12/09/06