Os sinos dobram por nós
Maleita europeia
Tanto o resultado das eleições italianas nos passados dias 9 e 10 de Abril, como o recuo de Dominique de Villepin no Contrato Primeiro Emprego, têm preocupado alguns analistas e dado azo a inúmeros artigos na imprensa por esse mundo fora. Há muita gente inquieta com o futuro da Europa, mas a causa dos maiores receios está na tranquilidade com que os europeus vivem estes dias.
Parece contraditório, mas não é. Os cidadãos vivem, na sua maioria, o imediato e este ainda é pacífico e aprazível. Na Europa ainda se vive bem e todas as manifestações de descontentamento são para manter o que há e nunca para mudar. ‘Resistir é vencer’. A velha máxima de Xanana Gusmão tornou-se o lema dos europeus.
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Enquanto estivermos neste pé não haverá mudanças nas políticas. O futuro pode não ser negro, mas será certamente pior e apenas quando a maioria passar de privilegiada a descontente, as reformas do modelo social europeu serão feitas. Até lá é esperar e pregar no deserto. Em democracia a paciência, é uma louvável virtude, embora que, por vezes, desesperante.
Ora vejamos: Na Itália, Prodi leva para o seu governo comunistas que jamais aceitarão a mínima alteração à lei laboral. Ao invés, tudo farão para fechar as fronteiras aos produtos mais baratos em prol da defesa dos seus trabalhadores. No entanto, a emenda é pior que o soneto. São esses trabalhadores que ficarão obrigados a comprar o que há de mais caro e com tendência a piorar de qualidade. Produzindo mais caro e pior, o destino natural é o desemprego.
A França é ainda mais deprimente. Por cada tentativa de liberalização é aplicada outra mais proteccionista. Veja-se esta proposta de um estudante francês para o combate ao desemprego. Ele diz não acreditar em milagres, mas uma leitura atenta do que propõe, leva a crer que sim. É que subsidiar as empresas para contratarem jovens trabalhadores é tão forçado e apenas compreensível por quem considera que os governos sabem (e devem) melhor que ninguém gerir as empresas dos particulares. Não é todos os dias que se vê uma nação a virar as costas ao mundo. Não é caso único, mas raro e de destino traçado: a decadência.
Desassombro chinês
Enquanto a Europa olha para o umbigo, o presidente da China visitou os EUA. Imbuído da milenar sabedoria chinesa, pousou primeiro em Seattle em visita à Microsoft e à Boeing. Até na mansão do Bill Gates ele esteve para luxuoso cocktail. É assim o comunismo desavergonhado. Não é, no entanto, apenas nestes pequenos pormenores que a China dá sinais de si. Acusada pelos EUA de seguir medidas mercantilistas ela anda a comprar energia em todos os pontos do mundo, com especial ênfase naqueles onde a noção do que seja respeito pelos direitos do homem é ínfima. Tudo vale para fazer bons negócios em regiões onde os ocidentais tinham esperança de fazer valer os seus pontos de vista. A juntar-se a isto há a moeda chinesa que não valoriza, os produtos chineses demasiado baratos que rebentam com empregos na América e põem congressistas doidos em ano de eleições. Há os interesses chineses no Irão, a protecção à Coreia do Norte, as inimizades com o Japão, Taiwan, o questionável défice comercial dos EUA, o desrespeito chinês pela liberdade e uma lista interminável que tornaria este ‘post’ demasiado longo.
A força chinesa, por agora é económica e dá nisto. Custa imaginar quando for também militar. Mas foquemo-nos na área económica, mais precisamente no questionável défice comercial dos EUA para com a China. Digo questionável porque os políticos americanos, mais precisamente os Congressistas, deveriam dar um pouco de atenção ao editorial do Wall Street Journal da passada quinta-feira. Se a China produz barato, tal constitui uma belíssima oportunidade para as empresas americanas reduzirem os seus custos de produção e vender a preços bem mais competitivos por esse mundo fora. Produzir na China é excelente e bem pode dar fôlego a muitas empresas aflitas em manter a sua competitividade na era globalizada. Mas há mais. Se é verdade que a China vende mais que compra à América, também é certo que os chineses importam dos restantes países asiáticos, bem mais do que exportam. Refiro-me principalmente à matéria prima que a China tem de comprar para fabricação dos seus produtos. Não sendo a produção feita na China totalmente chinesa, o dito défice é bastante mais reduzido ou, valha-nos isso, menos perigoso do que se julga. Além de tudo o mais, o desenvolvimento chinês está a conduzir o seu povo a uma significativa melhoria do nível de vida. As consequências são normais: Mais democracia e liberdade, redução do receio militar e subida dos custos de produção chineses. O resultado final está à mostra e é o fim da chatice do défice. O que é preciso é seguir o caminho contrário ao dos italianos e franceses. Aproveitar a competitividade comercial da China e nunca combatê-la.
por André Abrantes Amaral @ 4/26/2006 01:45:00 da tarde
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