Os sinos dobram por nós
A nuvem chinesa
Muito se fala por aí da China. Da sua pujança económica, dos famosos têxteis e do desemprego que afecta e prejudicará muitos em Portugal. Sucede que a ameaça chinesa é bem maior que as desconsiderações causadas ao nosso país e baseia-se fundamentalmente na incerteza. Na dúvida do que vamos ter daqui a uns anos, na insegurança sobre a melhor forma de lidar com este problema. Muitas hipóteses pairam no ar e todas elas tornam a nuvem chinesa mais negra.
De acordo com esta notícia, a Rússia e a China encontram-se a estreitar relações diplomáticas, que se traduzem na assinatura de vários acordos comerciais, com a Rússia a fornecer a China de petróleo, gás e umas armas pelo meio. Até nos exercícios militares aquelas duas potências parecem ter encontrado necessidades em comum. A complicar toda esta situação há a possibilidade de criação do género de uma NATO por aqueles lados, englobando também os países da Ásia Central. À partida, esta realidade seria contraditória, pois se a América precisa da Europa para enfrentar a Rússia, necessita da Rússia para contrabalançar a China. Equilíbrios que todos agradecem, pois a vida é cheia destas coisas engraçadas. No entanto, o vazio de poder que pode surgir a qualquer momento na Ásia Central (o Iraque - que sempre pode resvalar para o caos -, o Irão – cujos devaneios a Rússia só tolera até um certo ponto -, e em todas as repúblicas islâmicas da Ásia Central – que podem cair nas mãos dos fundamentalistas) convidam russos e chineses a concluir que se não forem eles, serão os americanos a ter de impor a ordem.
###
A Rússia tem um particular interesse neste cenário de aproximação à China. Expulsa do leste europeu, procura expandir-se para Oriente, o lado mais esquecido do mundo e onde tem esperanças de, quanto antes, recuperar um pouco do orgulho perdido. Quanto à China, tudo é uma oportunidade de sorrateiramente ir dando um ar da sua graça. Por enquanto, não quer dar nas vistas de forma a não assustar. Dentro de uns anitos (não muitos) já será a doer.
Quais as ilações de tudo isto? A primeira é que o mundo unipolar (no qual apenas os EUA projectam poder) acabou. Naturalmente que os efeitos se sentirão apenas a prazo, mas a realidade é já bastante diferente da que tínhamos na última década do século XX. A segunda Guerra Fria (como lhe chama Robert Kaplan) começou; um novo equilíbrio de forças está a surgir e o mercado das alianças anda ao rubro.
Em segundo lugar, se um país como o nosso não deve temer a concorrência dos produtos chineses, já deve ter em conta as dificuldades inerentes ao aumento do poder daquele país. A razão é simples e prende-se com o desinteresse que a Europa pode começar a suscitar. Um continente onde as pessoas ficam mais velhas e têm menos filhos, é um local sem futuro. Ora, o futuro é indispensável e a sua inexistência não é aliciante para quem investe. Como a vida tem esta piada de ser aos círculos, somos forçados a concluir que onde não se investe, não há lucros e o dinheiro escasseia. Uma coisa leva, invariavelmente, à outra. A nuvem chinesa não está nos seus produtos baratos, que nos cabe agradecer. Ela espera pelo dia em que a China irá impor as suas regras e começarmos a piar fininho.
por André Abrantes Amaral @ 3/15/2006 01:56:00 da tarde
<< Blogue