Votos validamente expressos
Os insurgentes Pintoff e André Azevedo Alves já fizeram referência à não contagem dos votos brancos e nulos para o apuramento do resultado final (ver STAPE).
No entanto, a interpretação do STAPE não está de acordo com a legislação eleitoral:Artigo 10º (Critério da eleição)
Tal significa que votos nulos devem ser considerados "votos validamente expressos". Deste modo, Cavaco Silva ganhou as eleições com 50,19% dos votos expressos.
1. Será eleito o candidato que obtiver mais de metade dos votos validamente expressos, não se considerando como tal os votos em branco.
Porém, julgo que os votos em branco também deveriam ser contabilizados como votos expressos dado que, segundo a mesma lei eleitoral, o exercício do direito de voto requer apenas a identificação do eleitor:Artigo 75º (Requisitos do exercício do direito de voto)
Logo, qualquer escolha do eleitor no boletim de voto é um voto expresso. Mesmo o voto em branco. 58.868 eleitores fizeram essa opção.
Para que o eleitor seja admitido a votar deverá estar inscrito no caderno eleitoral e ser reconhecida pela mesa a sua identidade.
Ora, se os votos em branco também são "votos validamente expressos", haveria necessidade de uma segunda volta (Cavaco Silva teria apenas 49,66% dos votos expressos).
Nota: na revisão constituicional de 1982 a interpretação dos deputados em relação aos votos em branco foi diferente da minha. Da versão anotada da lei eleitoral do Presidente da República:###Este artigo tem redacção dada pela Lei n° 143/85, de 26 de Novembro (DR n° 272 - I Série - suplemento). A anterior redacção deste preceito, nomeadamente a do seu n° 1 - «considerar-se-á eleito o candidato que obtiver mais de metade dos votos validamente expressos» - gerou acesa polémica entre várias entidades com responsabilidade no processo eleitoral, acerca do significado da expressão votos validamente expressos.
PS: quem, como eu, não concorda com a apresentação de resultados efectuada pelo STAPE (pelo menos em relação aos votos nulos a lei é clara) pode enviar a sua queixa à Comissão Nacional de Eleições (email).
No fundo tratava-se de saber se votos validamente expressos seriam apenas os votos válidos em cada um dos candidatos (cfr. n° 2 do artº 87°) ou se seriam integrados também pelo conjunto dos votos em branco, com exclusão apenas dos votos nulos (cfr. n° 2 do artº 88°).
Segundo o ponto de vista do STJ (cuja competência no processo eleitoral está atribuída desde Novembro de 1982 ao Tribunal Constitucional) que desde as primeiras eleições presidenciais realizadas em 1976 fixou doutrina acerca deste assunto, a qual foi secundada pelo Secretariado Técnico dos Assuntos para o Processo Eleitoral (STAPE), votos validamente expressos eram todos aqueles que exprimiam a escolha expressa de alguém para exercer determinado cargo.
Tendo partido do princípio de que «eleger é escolher, logo o eleitor que votava em branco ao recusar-se a fazer a escolha entre os diversos candidatos, não elegia nenhum deles, antes se limitava a depositar nas urnas um mero papel sem significado jurídico, pela impossibilidade em termos de escrutínio, de se vir a recolher qual a sua vontade expressa».
Opinião diversa sustentava a CNE, para quem «o voto em branco era um voto que de forma alguma podia ser considerado menos expressivo da vontade do eleitor, pois constituía o exercício do direito e dever cívico de votar, apesar de não pretender o eleitor optar por qualquer dos candidatos que se apresentavam ao sufrágio».
Aliás, no dizer da CNE, tal entendimento «coincidia com o espírito constitucional que visava garantir que o candidato eventualmente eleito à primeira volta não tivesse contra ele mais votos do que os que ele próprio obtinha».
Este diferendo foi ultrapassado aquando da revisão constitucional de 1982 (cfr. artº 126°) e consagrado na lei eleitoral para o Presidente da República em alteração introduzida pela Lei n.° 143/85, de 26 de Novembro.
Adenda: a minha interpretação de "votos nulos" restringiu-se aos votos inutilizados propositadamente pelos eleitores que, penso, deveriam ser contabilizados por tratar-se da expressão do seu direito de voto. Contudo, a dificuldade de interpretação sobre a intencionalidade do acto do eleitor tornaria o processo de contagem demasiado subjectivo. Deste modo, concedo que um "voto nulo" não poderá ser considerado um "voto validamente expresso", pelo que a discussão deve centrar-se exclusivamente na revisão constituicional de 1982 e na validade do "voto em branco". Obrigado ao LA-C e AAA pelos comentários.
por BrainstormZ @ 1/23/2006 01:22:00 da tarde
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