A Europa não deve opor-se ao Ocidente
Depois do ‘Não’ francês ao Tratado Constitucional, um dos argumentos mais ouvidos pelos partidário do ‘Sim’ foi o de se ter perdido uma boa oportunidade de a Europa fazer oposição aos EUA. Naturalmente que isto é conversa, tal qual foi conversa a Cimeira de Lisboa e a aludida liderança tecnológica e científica da Europa, em 2010. Convém, no entanto, analisar, por que motivo não deve a Europa opor-se aos EUA. Porque deve continuar lado a lado com aquele país.
Há quem esqueça ser a Europa o centro do Ocidente. A civilização ocidental (e com ela os valores que partilhamos) nasceu no continente europeu. Espalhou-se depois pelo mundo inteiro e não vou discutir se bem, se mal. O certo é que se estendeu a todos os cantos do planeta e, por diversas vezes, esteve em risco na própria Europa. Os valores ocidentais, que tanto prezamos, devem ser mantidos e vão ser postos à prova, nos anos que se aproximam, com a ascensão da China e da Rússia e com a instabilidade árabe. Os EUA são a nação mais forte para defender e promover estes valores.
Sucede que a América não é única e exclusivamente poder.
Vivemos num mundo diferente daquele a que nos habituámos. Se a propagação da democracia, tal como é entendida e defendida pela Administração Bush, é desejável aos interesses americanos, ela pode conter uma outra face que é a redução do poder americano. Com cada vez mais Estados democratizados, menor será o poder dos EUA. A democracia pressupõe que a política se rege por princípios morais, logo o simples equilíbrio de poder procurado e encontrado pelos grandes líderes mundiais, na base dos interesses dos seus povos, será mais difícil de explicar e de concretizar.
De futuro e à medida que regimes outrora totalitários se transformam em democracias, deixam de ser certas as alianças políticas internacionais. Se a deposição de um chefe de Estado hostil é já de si complicada, mais complexa será a arte de convencer uma opinião pública habituada à democracia e à economia de mercado, a ver com bons olhos certas orientações da política externa norte-americana.
A força americana (por querer instituir a democracia e, dessa forma, dar voz ao povo) sujeita-se à incógnita de quem acredita no livre arbítrio dos povos e, se por um lado a democratização desses regimes lhe pode trazer mais segurança, por outro, trará, de certo, mais incerteza. Um mundo sem senhores, nem escravos é um mundo que não faz uso unicamente da força bruta.
É aqui que a UE poderia ter uma palavra a dizer. De acordo com as últimas orientações da Administração norte-americana, os EUA podem ter realizado que o poder não é apenas puramente militar. Têm também de conversar. O papel da Europa pode ser este: O de contribuir para um poder cada vez mais diplomático, um poder cada vez mais adequado à realidade liberal.
Não será, no entanto, opondo-se à América que o conseguirá. Se seguir por essa via, a Europa tenderá a perder-se em conflitos com aquela que poderia ser a sua aliada e a descurar os adversários e os problemas que vivem mesmo ao seu lado. A Rússia, o Médio Oriente, o Magreb e, naturalmente, a China.
por André Abrantes Amaral @ 6/03/2005 12:09:00 da tarde
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