15.2.06

Educação: Para uma eventual continuação do debate

Concordo com a ideia do voucher. Acho uma óptima ideia, bem como o facto das escolas poderem escolher os próprios professores que querem em vez do Estado impor estes àquelas.

No entanto não concordo com a ideia de "não devendo o estado ter qualquer intervenção nesta matéria".
O Estado não deve escolher o currículo? Assim corre-se o risco de dois alunos de escolas diferentes terem dado matérias diferentes no mesmo nível lectivo? Isto não criará vários sistemas paralelos de ensino? Há matérias que têm precedências (sobretudo nas disciplinas cientificas); as universidades escolhem as provas especificas que desejam impor aos candidatos com base no currículo das disciplinas que não é mais que um garante que o aluno sabe A, B e C.
Se não definirem o currículo, pelo menos que definam os exames, que é praticamente o mesmo. Mas tem de existir uma garantia que todas as crianças (adolescentes) em determinados níveis (ao 4º, ao 9º e ao 12º p.ex.) têm os mesmos conhecimentos.

Outra ideia com a qual não concordo totalmente:
"Há a certeza que muitas crianças mais desfavorecidas são salvas pelo estado e que os pais são um perigo para o seu futuro." Bem, quer dizer... nalguns casos, absolutamente!!! Preconceito social? Como é que uns pais que têm a 4ª classe podem avaliar qual o melhor currículo para o futuro do seu filho?? E olhe que apenas 20% da população (activa) tem o ensino secundário! Eu não acho que o problema está nas matérias ensinadas nas escolas, mas sim no facto de elas não serem ensinadas ou aprendidas.

Gostaria de saber o que acha desta questão da equivalência de conhecimentos. De resto achei a sua análise bastante boa.

Alexandra

Só mais um ponto:

Para além de que se duas escolas não seguirem linhas curriculares idênticas, como é que poderá um aluno mudar?? Cairá "de pára-quedas" num ambiente curricular completamente diferente!


Alexandra

Se o Estado não der um mínimo de orientação ao curriculo escolar obrigatório quem garante que não aparecerão escolas corânicas subsidiadas pelo voucher a ensinar árabe como 1ª lingua e português como lingua estrangeira ?
Ou umas que não ensinem história de Portugal ?

Mentat


Alexandra,

Obrigado pelo seu comentário. Vou ser conciso nas minhas respostas. Não o tome como uma desconsideração, mas antes por se tratar de uma caixa de comentários onde é difícil expor todo o nosso raciocínio de forma conveniente e percebível.

A Alexandra diz: “O Estado não deve escolher o curriculo? Assim corre-se o risco de dois alunos de escolas diferentes terem dado matérias diferentes no mesmo nível lectivo? Isto não criará vários sistemas paralelos de ensino?”

Não vejo aqui um risco, antes uma vantagem. A diversidade é uma grande vantagem para uma sociedade. A equivalência de conhecimentos não é o mais importante. O essencial é que esses conhecimento sejam bons e úteis aos alunos.

Veja o seguinte: Os pais escolhem as escolas dos filhos. Naturalmente, procurarão as melhores escolas e aqueles cujos programas sejam úteis para a sua aprendizagem.

André Abrantes Amaral

Mentat,

"Se o Estado não der um mínimo de orientação ao curriculo escolar obrigatório quem garante que não aparecerão escolas corânicas subsidiadas pelo voucher a ensinar árabe como 1ª lingua e português como lingua estrangeira ?
Ou umas que não ensinem história de Portugal?"

Creio que os pais só aceitaram que os seus filhos aprendam árabe se virem nisso uma vantagem. Não havendo, nenhuma escola ensinará árabe. Há matérias onde não é preciso proibir. Não vale a pena proibir aquilo que as pessoas não querem.

André Abrantes Amaral

"Há matérias onde não é preciso proibir. Não vale a pena proibir aquilo que as pessoas não querem."

Caro André

Induzi em erro com a minha questão e pelos vistos dei azo a uma série de comentários "iranianos".
A minha questão era:
Não acha lógico, que mesmo num sistema de ensino totalmente privado, o Estado não deva impor um curriculo mínimo que garanta que os valores da nossa sociedade e que nos distingue como Povo, seja transmitido às gerações futuras ?
Não se trata de proibir nada ou impor uma visão orientada politicamente, mas sim garantir que o ensino forma Portugueses e não outra coisa qualquer ?

Mentat

Caro Mentat,

Não acho absolutamente necessário que o Estado imponha um curriculum ou programa mínimo. Os valores da nossa sociedade foram criados por esta, pelo povo, não pelo estado. Assim sendo, não vejo como o Estado protegeria esses valores de melhor forma que as pessoas. Na minha opinião, são os indivíduos os maiores interessados na manutenção desses valores e são eles os únicos, os capazes de os inovar constantemente à maré das novas necessidades. Até porque se colocaria a questão: Quais valores?


André Abrantes Amaral

Sobre a escolha dos pais

As pessoas que só têm a 4ª classe mtas vezes percebem mto mais do que aquilo que o resto da sociedade pensa. Há situações em que a sua clarividência em relação à educação dos filhos é até superior à das pessoas com cursos superiores

Eu concordo com quase td. Acho que as escolas devem ter mtp mais liberdade na escolha de currículos e talvez a única coisa que é necessária para além do que referiu no seu post são os exames. Mas estes também não precisam de ser estanques e absolutos. Podem ser apenas alguns conteúdos que se considerem necessários mas que permitam que a escola continue a ter liberdade de manobra.

Outra forma de resolver o problema (especialmente ao nível do acesso ao ensino superior): as faculdades possuírem os seus próprios exames e formas de selecção. Os alunos, em vez de concorrer nacionalmente, concorrem directamente às faculdades que lhes interessam. Ao contrário daquilo que se pensa, creio que seria relativamente fácil manter o processo transparente.

Sara

"As pessoas que só têm a 4ª classe mtas vezes percebem mto mais do que aquilo que o resto da sociedade pensa. Há situações em que a sua clarividência em relação à educação dos filhos é até superior à das pessoas com cursos superiores"

Em relação à vivencia diária sim, talvez, mas em relação à educação dos filhos não creio. E muito menos nos meios rurais. Note que eu não estou a chaamr estupidas às pessoas, nem é uma forma de paternalismo, é apenas uma opinião. Muitas pessoas acham até que a escola não é necessária porque "eu só tenho a 4ª classe e olhem para mim tão bem sucedido na vida, os putos têm é que trabalhar e não estudar". Isto são coisas que se ouvem hoje no portugal rural! Não é só saber se a matemática é importante ou a física ou a quimica! É que matérias dentro destas disciplinas.
Imaginem uma criança que não deu a matéria X no 9º ano e agora ela é necessária para aceder ao curso universitário que quer. O mesmo com a materia Y e Z enquanto que andou a perder tempo com a W e a T que agora não precisa para nada. Deve a criança planear todo o seu futuro académico desde o inicio de modo a não incorrer nestas situações?

E se uma criança quiser mudar de escola? Entre anos ou no meio do ano até?

Qual é o problema de ser o Estado a definir os curriculos?

Alexandra


«Os pais escolhem as escolas dos filhos. Naturalmente, procurarão as melhores escolas e aqueles cujos programas sejam úteis para a sua aprendizagem.»

Seria assim se não interviessem outros factores na escolha. Por exemplo, a proximidade geográfica (numa vila em que haja uma única escola, não há qualquer «escolha»). Ou então, o facto de os pais já terem um filho na escola X.

Ricardo Alves


Parece-me que há aqui uma clara entrada em transe liberal. Obviamente os curriculos devem ser decididos centralmente e não escola-a-escola. Para além dos motivos óbvios há um muito importante: deficiências de informação. A maioria esmagadora dos pais desconhece os curriculos escolares das escolas dos seus filhos e, mesmo tendo dados históricos, nada impede uma escola de alterar completamente os currículos de um ano para o outro. E escolher uma escola, principalmente num modelo de curriculos liberalizados, não é como escolher uma marca de cereais. Uma má escolha desinformada teria como consequencias a perda de, no mínimo,um ano escolar para o aluno. Tem que haver uma regulação central como em quase todos os sectores para combater as deficiências de informação.

Karloos


Sobre a privatização das escolas:

Imagine o André que, por exemplo, o governo iraniano, no seu pleno direito como agente económico, comprava todas as escolas do Algarve a Aveiro e impunha um currículo em que se ensinasse que o holocausto nunca existiu e onde forçasse as alunas a usar o lenço islâmico na escola. Que fazer neste caso? Deixar o mercado funcionar e esperar que todas as familias portuguesas se mudem para o norte do país?
Ou então, num cenário mais realista, que houvesse um take-over regional feito pela igreja católica, pelo PCP,...


Karloos


E que país colocariam os filhos nessas escolas?
Acaso não estariam a abrir mercado para novas escolas, como curriculo "normal" aparecerem?

Por outro lado no sistema actual qualquer que seja o curriculo adoptado pelo MNE os país não têm escolha. Mesmo que a matéria de algumas disciplinas seja um disparate.

Miguel Noronha

"Imagine o André que, por exemplo, o governo iraniano, no seu pleno direito como agente económico, comprava todas as escolas do Algarve a Aveiro e impunha um currículo em que se ensinasse que o holocausto nunca existiu e onde forçasse as alunas a usar o lenço islâmico na escola. Que fazer neste caso?"
Eu abria logo uma escola com um currículo "ocidental". Era sucesso garantido, pelo menos até outros fazerem o mesmo e concorrerem comigo nesse nicho de mercado.


CMF

Boa Noite,
Fico satisfeito pelo interesse causado pelo tema (+ de 30 comentários). Já quando do debate o que mais me agradou nas propostas apresentadas pelo André Amaral foi o serem uma verdadeira reforma no sistema. Claro que podemos sempre arranjar exemplos, casos particulares de "injustiças". Alexandra, coloca o problema se um aluno quiser mudar de escola...? se os pais foram "menos capazes" de escolher o melhor para os seus filhos...? Tudo são questões válidas, agora a minha opinião não podemos ter a pretenção de evitar o "sofrimento" numa mudança desta natureza! Não podemos nem devemos! É para mim o grande entrave Português para o desenvolvimento...a ideia é boa mas teríamos de mudar mentalidades para ser aceite! Este é o tipo de argumentos para quem nada quer alterar. Com o actual sistema, não temos só alguns exemplos pontuais de "injustiça". Temos milhares deles! Atrevo-me mesmo a dizer que gerações inteiras foram Injustiçadas! Gerações inteiras que foram vitimas por ex. do péssimo ensino da matemática que temos...que empurra as pessoas para carreiras nas ciências sociais com as consequências ao nível do desemprego licenciado que temos! Como será ossivel o tal do plano tecnológico, e o fomento da inovação quando mais de 80% dos alunos não conseguem sequer uma nota positiva mínima a matemática!!?? Estes sim (e falo de gerações inteiras) são os injustiçados!
A principal ideia que me agradou apresentada pelo André, para além da liberdade e responsabilidade pela educação de cada um que traz para o sistema (sim porque o futuro de cada um deve ser da sua responsabilidade e não estar à espera da "almofada" do estado para qualquer irresponsabilidade que tome, por ex. abandono escolar), foi a competição! Sim, competição algo que choca muito a Sociedade Portuguesa. A tal lei da selva como dizem alguns. E não este "deixa andar" nacional e paternalismo com que tudo é tratado. Quem não se lembra das manifestações de estudantes sempre que se quer introduzir o mínimo de exigência no sistema (eu próprio vivi as da PGA. Lembram-se?)? Dos protestos que causaram quando as universidades vieram dizer que para entrar terá de ter no mínino nota positiva! E Espantem-se, houve cursos que se teve de deixar os "meninos" entrarem com negativas! Será que alguém acha isto normal !!??
Quem não se lembra do choque causado a alguns com a avaliação pública das escolas? Pois por muito que choque as nossas mentalidades...só com competição se conseguem resultados. E mesmo aqueles menos capazes são motivados e "puxados" para cima! Este é acho a principal virtude. Competição entre escolas e professores para que aqueles que sejam medíocres sejam simplesmente eliminados do sistema! Sim , eliminados...exactamente como na teoria Darwiniana da evolução! Só aqueles que sirvam e se adaptem ao meio envolvente devem sobreviver!
Acredito que é uma ideia que devido às tais mentalidades nacionais cause repulsa, especialmente nessa corporação imensa e crescente (crescente mesmo no desemprego) que são os professores. Mas como disse de inicio para se resolverem os problemas terá de haver "sofrimento". Foram empurrados para uma carreira sem futuro (com a queda da natalidade cada vez serão necessários menos professores), agora a solução é virarem agulhas e escolherem outra carreira, sendo que o estado não pode garantir rendimento a estas pessoas....
A privitização do ensino teve uma experência ao nível do superior, mas mais uma vez, o estado matou a possibilidade de sobrevivência deste escolas. Em vez de chamar as privadas para tomarem conta de algumas públicas, aumentaram as vagas e baixaram as notas de entrada dando acesso a práticamente todo os alunos que desejem ingressar no ensino superior! Claro com o consequente aumento nos gastos, mas o dinheiro público é facil de gastar, não tem dono....
Bem hajam pela paciência e um obrigado ao André Amaral, esperando eu por mais temas destes colocados no blog...e mais uma vez peço...esqueçam pequena intriga e vaidades políticas... tratem do que realmente interessa...já que existe aqui muito boas ideias e gente capaz e só assim podem trazer mais gente para a causa... Eu já cá estou...


José Carlos Morais