Here we go again….(revisto)
….começando na língua sem regras de Guilherme Abanapêra.
Este comentário do José Barros a um post do Tiago Mendes, suscita-me uma reflexão.
O umbiguismo (como lhe chama de modo certeiro JPP) na blogosfera é um facto incontornável e que se reflecte essencialmente nas caixas de comentários. Este umbiguismo impede-nos, a quase todos, de debater considerando que o “outro” está de boa-fé. Pela minha parte, quando leio algo com que não concordo, não me passa pela cabeça que quem o escreveu esteja de má-fe ou seja um idiota sem remissão. É claro que há escritos que mais não fazem, que puxar pelo riso*. Outros , se lidos com a noção que quem o escreveu está de boa fé, são fácilmente entendidos e aceites.**
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Dizia eu, o comentário do José Barros (um dos mais estimulantes e educados comentadores habituais no Blasfémias), padece de uma série de mal-entendidos que também são habituais em quem comenta o que escreve o João Miranda***. No caso em apreço, o JM não discute os direitos individuais, que para ele (acredito) são um dado adquirido. Discute isso sim, a legislação, que na perspectiva Liberal é diferente de Lei. Insurge-se ;) e bem contra o positivismo da lei, contesta o cerrar de fileiras dos que, pelo menos na aparência, gostariam de silenciar o direito que o Miguel Sousa Tavares tem de dizer o que pensa. Daí há quem parta para a ideia que o JM defende o mesmo que o MST no que respeita aos direitos individuais de duas miúdas de Gaia, o que não é verdade. O que não é admissível é esta “one way tolerance” que parece moda em que só alguns podem dizer o que lhes apetece, aqueles que defendam a discriminação positiva e a responsabilização do homem, branco e heterossexual pelos males do mundo. Esta ideia que mulher, negra, homossexual e deficiente tem direitos que não assistem aos outros. Não tem. E atribuir-lhos na Lei é no mínimo criminoso. Porquê? Sabemos todos que os comportamentos em sociedade comportam preconceitos e injustiças. A questão é se a intervenção do estado no sentido de propor uma engenharia social que minimize os preconceitos e essa injustiça é benéfica ou não. E não são os Liberais que contestam essa intervenção que têm que prová-lo. Esta é a falácia argumentativa recorrente dos que advogam a intervenção dos poderes que são. Aceitando que os preconceitos são uma falha social, devem ser os que a querem corrigir que têm que provar que a intervenção externa a vai corrigir, como e em que sentido. As externalidades e “unintended consequences” são a primeira preocupação do Liberalismo quando falamos de intervenções exógenas e é neste sentido que deve ser entendido (na minha opinião) o que diz Mario Vargas Llosa.
Voltando à boa ou má fé. Não acredito que o Dr Francisco Louçã ou Jerónimo de Sousa desejem a eliminação física dos que não estão de acordo com a sua ideia de sociedade. Sei no entanto e a Historia tem-no provado à saciedade que essa é a consequência do que estes dois personagens defendem. Direi então que são burros, idiotas? Não. Simplesmente não os entendo e gostaria. Da mesma maneira, sabendo que Che Guevara foi um assassino e criminoso da pior espécie, não acho que haja má fé da parte de quem o acha um herói. Já escrevi algures inclusive, que em conversa com uma Sra que foi assessora do argentino Alfonsín, feroz defensora da revolução cubana, ela própria reconhecia que a tirania e a opressão eram o resultado lógico da mesma e mesmo assim, não deixava de acreditar na ideia romântica que a vida de Guevara representou. Só que factos existem e não dependem de interpretações mais ou menos benévolas.
Diz-se que os Liberais do Blasfémias, d’O Insurgente e do Acidental ( o Henrique Raposo ?) silenciam violações dos direitos individuais. Quando, onde e como? O que acontece é que desde que essa violação seja considerada como tal pelo mainstream, têm os liberais que dizer alguma coisa? Claro que não. A não ser que lhes seja exigido (começa a ser vulgar) que provem só e apenas nessas situações que são liberais. Pois no que me diz respeito, incomoda-me tanto a agressão a um homossexual porque o é, como a um skin head porque o é. Não queiram é acusar-me de selectividade liberal quando não intervenho onde entendo que não é necessário intervir. Há muito quem o faça.
Quem defenderia o direito de um skin head neo nazi, a não ser espancado por sê-lo? E eu (romantismo para o HR) sei donde venho, contra e por quem quem lutei e ganhei marcas no sentido literal do termo.
Sobre o Blasfémias, convém voltar ao Liberdade de Expressão e verificar se o João Miranda defende alguma coisa que não tenha feito aí ou sequer se o faz de maneira diferente. Não é esse o problema, a “million dollar question” é onde, nos media, em 2003 se escrevia sobre as opções políticas e económicas do Liberalismo? Em lado nenhum. Quem eram em 2003 os professores José Moreira, Rui Ramos ou João Carlos Espada? Ha muitos anos havia o Dr Pedro Arroja e era uma espécie de misfit de quem as pessoas se riam se fosse necessario. Muito pelo que se foi fazendo na blogosfera nos dois ultimos anos, no Blasfémias, Cataláxia, Jaquinzinhos, Intermitente, Impertinências, Semiramis, Aviz, etc, o assunto passou para o mainstream. E agora há esta confusão tremenda, este medo e esta exigência aos Liberais e às ideias que defendem. Vejam lá que já há gente que definiria como tolerantes e boas pessoas, mas que não fazem ideia do que seja o Liberalismo (confundem com tolerância e relativismo, ou liberalismo social musculado) que aconselham literatura aos que se assumem como Liberais.
Uma última nota sobre o post do Tiago. A discussão sobre a atribuição do Nobel da Literatura é sintomática do que escrevi acima. A ÙNICA coisa que estava em causa eram os critérios políticos na atribuição do mesmo. Nada mais. Considerando ainda que o alter-globalismo, o ecologismo, anti-americanismo, etc, são a corrente dominante do pensamento do nosso tempo Europeu. Neste sentido e só neste. Para quem tem duvidas disto ver quem foi escolhido na revista Prospect como o pensador mais influente da actualidade, isso, esse mesmo, Noam Chomsky. E mesmo que não valha a pena, reafirmo o que escrevi na altura e peço de novo as desculpas que pedi. Outro exemplo é a atribuição do prémio em Cannes ao “documentário” de Michael Moore. Digam-me que o prémio tem valor para a política que desejam ver implementada e para a diabolização quase-religiosa de George Bush (com quem não simpatizo) nem discuto. Digam-me que não há qualquer intenção política nesta atribuição e têm que levar comigo, tenha a importância que tiver.
Resumindo, os Liberais não silenciaram, não silenciam nem silenciarão nehuma violação aos direitos individuais. A corrente intelectual com que lidamos hoje é que faz da nossa voz apenas mais uma no meio da cacofonia histérica, quando defendemos os direitos dos negros, homossexuais, mulheres, etc e ficamos sozinhos quando ha que defender o direito à Liberdade de outros. Deve ou não um skin head ser defendido contra a agressão quando esta acontece por causa da ideologia que defende? Tem ou não tem o direito a exprimir-se de forma pacifica? Ou a Liberdade é so para alguns e todos os animais são iguais, mas uns são mais iguais que outros?
*O Filipe Moura escreveu àcerca da repressão sangrenta do cavaquismo, por exemplo.
** Não entendi porque é que o Henrique Raposo teve que escrever um segundo e terceiro posts de esclarecimento sobre o mesmo assunto, quando no primeiro já era evidente o que veio a repetir. Claro que lendo-o de boa fé e partindo do princípio que o Henrique não é um anafado nazi preconceituoso, o que parece dificil para o umbiguismo militante.
P.S. E não escrevo nada sobre Ayn Rand ou o Objectivismo, fica para quando estiver na disposição para aturar autos-de-fé.
P.S. II Se as diferenças se resumem a questões de estilo andamos aqui a falar de nada. Há coisas difíceis de perceber às vezes, mas só para quem precisa de rotular os outros. É no entanto sempre bom saber reconhecer o inimigo. Sem paranóias.
por Helder Ferreira @ 11/21/2005 11:53:00 da tarde
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