Re: Impostos como preços
Ver, por analogia, os impostos como se de preços se tratasse pode ter algumas vantagens a nível analítico. Convém no entanto não esquecer que, numa economia de mercado, só estamos perante um preço quando se trata de relações contratuais voluntárias o que, naturalmente, não acontece na cobrança de impostos pelo Estado.
Por outro lado, e apesar de eu estar muito longe de ser um especialista em fiscalidade, creio que o João Miranda está equivocado ao defender que o IRC não deve ser visto como uma dupla tributação. Falamos de dupla tributação porque o mesmo rendimento é tributado, sucessivamente, em sede de IRC e de IRS (quando os lucros são distribuídos). Trata-se, naturalmente, de dupla tributação económica, e não jurídica (porque são sujeitos diferentes a sofrer a tributação), mas trata-se inequivocamente de dupla tributação. É aliás esse facto que justifica que na generalidade dos sistemas fiscais haja formas de atenuar essa dupla tributação (em Portugal, actualmente isso acontece pela consideração para efeitos de IRS de "apenas" 50% dos rendimentos de capitais que tenham origem em lucros distribuídos por pessoas colectivas sujeitas e não isentas de IRC). O que está em causa é defender que a dupla tributação deveria ser completamente eliminada e não apenas atenuada. Essa é aliás uma das causas de longa data da direita liberal nos EUA, havendo uma abundante literatura sobre o assunto.
Também a associação da descida das taxas de IRC à grande capacidade de escolha das multinacionais me parece bastante discutível, já que a maioria dessas grandes multinacionais, antes de se instalarem, negoceiam geralmente um pacote de incentivos com as autoridades nacionais que pouco ou nada é afectado pela taxa de IRC em vigor. Creio que a descida das taxas de IRC tem mais a ver com alguma tomada de consciência por parte da opinião pública e da classe política dos efeitos nefastos de elevadas taxas para a competitividade das empresas nacionais do que propriamente com a "grande capacidade de escolha" das grandes multinacionais.
Por último, recomendo também os vários posts no A Arte da Fuga dedicados a este assunto:
- Fim do IRC (1)
- Fim do IRC (2)
- Fim do IRC (3)
- Fim do IRC (4)
(agradeco ao leitor EA a chamada de atencao para um erro contido numa versao anterior do post)
por André Azevedo Alves @ 10/24/2005 01:33:00 da manhã
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