Tapar o sol com a peneira
Existe em Portugal um erro, infelizmente muito comum, que consiste em tentar resolver os problemas utilizando as técnicas e soluções que deram origem a esses mesmos problemas. Um exemplo bem demonstrativo desta realidade é a forma como o governo (na verdade todos os governos) entende para resolver os fogos de Verão. Quando a dificuldade consiste na existência de uma floresta unificada e sem diversidade, construída como se fosse um todo único, as soluções apresentadas, tais como a construção de um avião bombardeiro de água europeu (link via blasfémias), o entendimento (segundo Sampaio já nos disse) de a floresta portuguesa ser um desígnio nacional (como se as dificuldades se resolvessem por magia) e até mesmo a ideia de Ana Gomes em atirar as culpas para o aquecimento global e a compra de aviões adequados. Outro exemplo muito característico está na forma de se encarar o défice público. Falta dinheiro, mas ninguém põe em causa o sistema em si, apenas se concluindo da necessidade de ter mais dinheiro, não importando de onde ele vem.
Todas estas tentativas para resolver os problemas (sempre apresentadas como milagreiras, e sobretudo justas) são meras formas de tapar o sol com a peneira.
Se assim é, somos obrigados a perceber por que motivo nada se muda e o erro se mantém. As razões são, a meu ver, essencialmente duas. Em primeiro lugar, existe uma incapacidade inconsciente em assumir o erro. A grande maioria da classe política portuguesa foi educada sob o princípio da resolução estatal dos problemas. Era assim com Salazar e não mudou (ao contrário do que teria sido desejável) com o 25 de Abril. Quando a receita não surte os efeitos pretendidos é difícil tomarmos consciência dessa falha até por não se vislumbrarem outras soluções. Em segundo lugar, existe o erro propositado, mas não mal intencionado. No dia em que, por exemplo, as políticas florestais do passado forem postas em causa, serão os próprios políticos a ser questionados. Na verdade, dá muito trabalho mudar de política. Não só é difícil, combater os interesses instalados, como também é complicado explicar aos eleitores o porquê de tamanha mudança.
Há alterações na política portuguesa que a serem feitas poriam em causa os últimos governos. Esta realidade assusta na medida em que o assumir erros de anos passados atemoriza qualquer um. Todo um povo é intrinsecamente humano e apenas com o tempo será possível vislumbrar soluções diferentes das que são apresentadas hoje.
por André Abrantes Amaral @ 8/23/2005 11:42:00 da manhã
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