Democracy must be something more than two wolves and a sheep voting on what to have for dinner. - James Bovard
19.4.05
Imprecisões
Muita gente à esquerda (para além de alguma comunicação social) ficou extremamente desiludida com a eleição de Ratzinger como Papa, neste caso, com o nome de Bento XVI. Compreende-se, afinal, na comunicação social, nos últimos dias, só se sabia caracterizar Ratzinger como um ultra-conservador (epíteto dos mais benignos ainda sim).
Assim, não é de espantar que, algumas horas após a sua eleição, aparece na internet o popular desporto de "pope bashing", por exemplo, em numerosos blogues esquerdistas norte-americanos (para os quais não faço ligações, por o mau-gosto e a estupidez serem demasiado evidentes). Também alguns blogues nacionais, entraram nesse desporto, embora, ainda assim (e reportando-me aos que li) ficando a milhas de distância do que circula pelas américas.###
Vem esta introdução a propósito desta entrada do meu amigo Jorge que diz o seguinte:
Antes de ser o sucessor de João Paulo II, Ratzinger foi o sucessor de Torquemada, à frente da Congregação para a Defesa da Fé (ex-Santa Inquisição), responsável pela excomunhão dos suspeitos de heresia.
Ora, neste parágrafo o Jorge comete uma terrível imprecisão (que aliás Manuela Moura Guedes também cometeu): a de considerar a actual Congregação para a Doutrina da Fé como sucessora da Inquisição espanhola, ou como se a Inquisição tivesse sido só uma em toda a história.
Sem me quer alargar em considerações históricas, a Inquisição medieval foi fundada por Gregório IX, em Fevereiro de 1231, com a Constituição Incosutilem tunicam. Esta Inquisição estava sob comando papal e era, geralmente, confiada aos franciscanos e dominicanos. Mas esta Inquisição medieval declinou por volta do séc. XV.
Paulo III, em 1542, decide criar a Congregatio romanae et universalis Inquisitionis, vulgarmente conhecido por Santo Ofício. Esta sim é a antecessora da actual Congregação para a Doutrina da Fé. Embora devesse ser universal, esta Inquisição nunca exerceu jurisdição na Península Ibérica (nem na Sicília por esta estar dependente a Espanha). A sua actuação não passou muito da Península Itálica. Em 29 de JUnho de 1908, S. Pio X, pela Constituição Sapienti Consilio, mudou o nome para Sagrada Congregação do Santo Ofício. Por fim, em 7 de Dezembro de 1965, Paulo VI, pelo motu proprio Integrae servandae dá-lhe o nome actual.
Por seu lado, a Inquisição espanhola, como posteriormente a portuguesa, é uma instituição completamente diferente. É um tribunal especial fundado em Espanha por Sisto IV, em 1478, pela bula Exigit sincerae devotionis affectus, como resposta aos pedidos dos reis católicos Fernando e Isabel.
Esta Inquisição diferia da inquisição medieval devido à sua centralização absoluta sob um inquisidor-geral nomeado pelo Papa sob proposta do rei. Mas o rei tinha o poder de substituir inquisidores, o que alterava as relações de fidelidade dos mesmos. A dependência do rei acentuou-se posteriormente, sendo por isso a Inquisição espanhol um instrumento real para controlo do país. O mesmo se passou com a Inquisição portuguesa aliás. A Inquisição espanhola foi extinta em 1820. A de Portugal foi extinta em 1821 pelas Cortes Constitucionais (1812 havida sido suprimida a de Goa).
De qualquer modo, tudo isto só para dizer que Ratzinger nunca poderia ser um sucessor de Torquemada, pois tratam-se de instituições completamente diferentes.
Mas, obviamente, e descontando desde logo que a Congregação para a Doutrina da Fé tem pouco a ver com a instituição estabelecida em 1542, esta ligação a uma personagem sinistra como Torquemada faz parte deste "pope bashing" para passar a ideia que estamos na presença de um indivíduo, no mínimo, sinistro.
Se para isso tiverem que cometer imprecisões, que se lixe! Para eles isso não tem importância alguma.
Muita gente à esquerda (para além de alguma comunicação social) ficou extremamente desiludida com a eleição de Ratzinger como Papa, neste caso, com o nome de Bento XVI. Compreende-se, afinal, na comunicação social, nos últimos dias, só se sabia caracterizar Ratzinger como um ultra-conservador (epíteto dos mais benignos ainda sim).
Assim, não é de espantar que, algumas horas após a sua eleição, aparece na internet o popular desporto de "pope bashing", por exemplo, em numerosos blogues esquerdistas norte-americanos (para os quais não faço ligações, por o mau-gosto e a estupidez serem demasiado evidentes). Também alguns blogues nacionais, entraram nesse desporto, embora, ainda assim (e reportando-me aos que li) ficando a milhas de distância do que circula pelas américas.
Vem esta introdução a propósito desta entrada do meu amigo Jorge que diz o seguinte:
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