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Body language
Chegou finalmente aquela altura do ano que justifica todos os sacrifícios feitos até agora. Horas de ginásio, musculação, step, pilates, piscina; infindáveis refeições ligeiras, consistindo numa vaga couve e sumos de fruta; toneladas de cremes regeneradores e adelgaçantes; todos estes sacrifícios vão resultar no tão ambicionado prémio: um corpo espectacular, para apresentar na praia durante um mês ou dois.
Não há dúvida que resulta. Os corpos que por aí se vêm são realmente muitas vezes espectaculares. O que me preocupa mais é o sacrifício para lá chegar. O que me preocupa mais é o puritanismo do programa. No fundo, trata-se de castigar os excessos da carne. Ou melhor, trata-se de castigar a carne, por causa dos seus excessos. Dir-se-á que não. Que os sacrifícios são feitos por uma promessa ou sugestão de sexo, o que já deixaria de ser puritano. Não sei. A mim parece-me que é mais a sugestão do que a promessa, e logo mais do que a concretização. Trata-se sobretudo de mostrar para sugerir. Até porque a prática contradiz o programa. A sedução passa tantas vezes por umas horas descomplexadas à mesa do restaurante, ou umas horas descomplexadas num bar com uns copos de álcool. E quem se castigou o ano todo estará ainda em condições de apreciar um momento sexual livre de neurose? Existirá anti-clímax maior do que estar num restaurante cheio de iguarias, onde o parceiro de refeição prefere apenas uma saladinha e uma água mineral, em vez de uma feijoada de búzios e um bom vinho branco?
A verdade é que também não estou em condições de aferir da verdade destas considerações. Policiado ferreamente por mulher e três filhos e dotado de um espírito conservador respeitador da família monogâmica judaico-cristã, não tenho oportunidade de testar empiricamente (já tive, já tive... mas foi há muito tempo). Mas, não me parece que esteja a perder muito. Ou melhor, parece-me que não estou a perder nada. Como o objectivo do programa é simplesmente mostrar o corpo, eu faço o que se espera: vejo e observo o dito. E é capaz de ser melhor assim. Porque quem não sabe comer, que outras coisas não saberá fazer também?
E assim parto de férias, plenamente integrado no zeitgeist . Volto em Setembro. Boas férias.
por Anónimo @ 8/04/2006 12:50:00 da tarde
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