O que é seu, é nosso
No nosso país, a necessidade de respeito pela propriedade e pelos direitos a ela ligados, não costuma estar no topo dos valores e regras que regulam as relações sociais. Assim se compreende que seja tido como perfeitamente aceitável que o Governo, através do Ministério da Saúde, se prepare para retirar aos proprietários de estabelecimentos comerciais a liberdade de escolherem qual o mercado para o seu negócio, quais os seus clientes. Estou a falar da legislação que impõe a proibição de fumar em bares, restaurantes ou noutros espaços de propriedade privada, deixando aos donos a responsabilidade de se queixarem às autoridades no caso de um cliente violar a lei. Para tal, o Governo invoca a necessidade de o Estado cumprir a garantia constitucional de proteger a saúde de todos os cidadãos.
A liberdade de escolha deveria ser assegurada não só aos proprietários, mas também aos eventuais clientes dos bens e serviços prestados nestes estabelecimentos. Desde que, de forma clara, seja tornada pública a opção feita por determinado restaurante ou bar, de proibir ou permitir que se fume no seu interior, a decisão de neles entrar e consumir deve ser da inteira responsabilidade do cliente. Só este deve avaliar se o fumo que pode encontrar no seu interior é factor determinante para não escolher aquele espaço para jantar, beber um copo, ouvir música ou dançar, optando por outro estabelecimento.
A livre concorrência, assente na inexistência de limitações administrativas, dará hipótese de satisfazer os vários tipos de clientela. Se a procura de espaços de lazer livres de fumo for da dimensão que se apercebe através dos inquéritos de opinião, os quais dão conta que os malefícios do tabaco (incluindo o fumo que vem dos cigarros alheios) são reconhecidos por muitos, tal atrairá os empreendedores. Uma definição clara dos direitos de propriedade pode corresponder a novas oportunidades de negócio e à entrada no mercado de novos empresários ou à reconversão de estabelecimentos já existentes.
Outra legislação, prestes a entrar em vigor, parte do papel do Estado como justiceiro social para justificar mais um ataque aos direitos de propriedade. No âmbito da nova lei do arrendamento, o Governo anunciou a pretensão de dar aos inquilinos o “direito de comprar” determinado imóvel, se os senhorios não realizarem obras de recuperação. Associado a tal direito, surge a indicação de como deverá ser encontrado o preço dessa compra. Isto equivale a retirar aos proprietários a capacidade de decidir sobre o destino dos seus bens, usando a lei para beneficiar um grupo específico de cidadãos.
Esquece-se que a degradação, que muitos imóveis sofreram, também resultou da continuada intervenção do Estado neste mercado. Ao estabelecer regras e limites para o valor das rendas e dos seus aumentos, restringiu os direitos do proprietário e criou barreiras à obtenção de rendimentos que assegurem a valorização do imóvel e a realização de obras. Esta insegurança, nos direitos de posse, contribui para diminuir o potencial deste mercado como destino no investimento das poupanças de muitos aforradores.
O Estado devia limitar-se a garantir que as escolhas dos seus cidadãos são livres, que o processo de negociação e contratação, entre quem presta um serviço ou vende um bem e quem decide adquiri-lo, é isento de alguma forma de coacção ou especial favorecimento de uma das partes. Tal podia ser conseguido se os legisladores, ao invés de pretenderem regular minuciosamente o funcionamento de um qualquer mercado, se preocupassem antes em melhorar a qualidade e rapidez do sistema judicial e a promover a segurança dos cidadãos e dos seus bens.
Pelos vistos, para o Estado, os direitos de propriedade só são absolutos na hora de cobrar impostos. Nessa altura, transformam-se em inúmeras e pesadas obrigações fiscais. No contexto actual, a propriedade privada é apenas mais um instrumento ao dispor do Estado e das políticas seguidas por quem prefere retirar aos indivíduos a liberdade de escolha e o pleno usufruto dos seus bens.
por LA @ 6/27/2006 10:29:00 da manhã
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