22.1.06

O fenómeno Alegre

Diz-se, n'O Acidental:

«Coisa preocupante: Cerca de 20% dos portugueses acha que política é recitar poesia e gritar vacuidades. Mas, coisa porreira, pelo menos 20% dos portugueses gosta de ouvir a palavra pátria».

Pessoalmente, acho que a votação em Manuel Alegre reflecte a apetência que têm os cidadãos - neste caso, à esquerda, mas este sentimento existe também à direita - por uma vida política que não seja mediada por partidos. O conteúdo da mensagem de Manuel Alegre não é assim tão vazia como muita gente quer fazer crer, e o facto de ter conseguido obter 20% do eleitorado traduz-se num sinal evidente: os partidos não são donos dos eleitorados. Este sinal esteve também presente na candidatura de Cavaco, que fez um enorme esforço por se apresentar ao eleitorado como sendo «supra-partidária».

Alegre fica com um capital mediático impressionante (teve quatro vezes mais votos que Louçã, um dos políticos que mais condiciona o espaço mediático em Portugal; mais votos que Louçã e Jerónimo juntos; e venceu Soares, um dos maiores políticos da história da democracia portuguesa), que ultrapassa até aquilo que ele representa enquanto político. O seu resultado eleitoral é antes a expressão de um grito: pode ser um fogo fátuo, o gesto acalorado de um poeta, e não ter consequências práticas; o tempo encarregar-se-á de responder a esta incógnita. Agora, o que desde já fica como um marco, é o grito de um milhão de cidadãos: «A mim ninguém me cala»!

Rodrigo Adão da Fonseca