Do utilitarismo ao prazer absoluto de Henrique Raposo
Presumo (não tenho a certeza porque o post em causa não inclui nenhum link) que o texto Sobre a Utopia utilitária seja uma reacção do Henrique Raposo à singela observação que fiz aqui. No post Liberais que aparentemente deixaram de o ser limitei-me a constatar que, se tal como faz o Henrique Raposo, afirmarmos que "[u]m liberal deixa de o ser quando nega o direito natural", então daí decore que autores como Mises, Hayek, Friedman ou Buchanan não podem ser considerados liberais. A conclusão é, obviamente, absurda (para não dizer bizarra...) mas deriva directamente da afirmação do Henrique Raposo.
Na sua (suposta) resposta, o Henrique Raposo discorre sobre o utilitarismo apresentando algumas considerações sobre a sua ligação com o liberalismo. No meu post inicial não fiz qualquer menção a utilitarismo; limitei-me a fazer uma constatação óbvia do que decorreria da aceitação da afirmação do Henrique Raposo.
Podia agora escrever sobre os diferentes tipos de utilitarismo, sobre a importância de não confundir utilitarismo e consequencialismo, sobre a importância dos vários tipos de utilitarismo no Iluminismo Escocês (aliás uma das suas principais distinções face à versão continental), sobre a relação entre o cepticismo liberal e o utilitarismo, sobre a ideia straussiana de que o liberalismo contém em si mesmo uma tensão (possivelmente irresolúvel) entre direitos individuais e direito natural, ou mesmo sobre as tentativas de compatibilizar o(s) utilitarismo(s) com o direito natural. Como, para além de liberal, sou adepto do jusnaturalismo e também tendo em conta que não me parece que tais incursões fossem passíveis de frutificar neste contexto, não o farei.
Limitar-me-ei a assinalar que, quando se lida com filosofia política, convém assegurar um mínimo de rigor e exercer prudência no que se escreve e diz. Isto é verdade quer se discuta o conservadorismo, o liberalismo ou o socialismo. Ou quer se comentem as "grelhas conceptuais" de Schmitt, Hayek ou Negri. Sem um mínimo de precauções, há um forte risco de cairmos na asneira e na vacuidade pura e simples. Vícios a que todos estamos sujeitos (ou não fôssemos demasiado humanos) mas que urge evitar, mais do que por motivos de vaidade pessoal, pela delicadeza dos assuntos tratados.
Para além da totalmente despropositada conotação com Bentham, estranho também a referência do Henrique Raposo a "esquerdistas", que só consigo explicar por ser um tópico recorrente nos seus posts. Se se refere à discussão com o Nuno Ramos de Almeida sobre uma crítica ao último livro de Negri publicada no Diário de Notícias, lamento não me poder pronunciar sobre a qualidade da mesma visto que não li a crónica em questão. No entanto, como não quero ser responsável por desfazer a notória aliança entre liberais e a extrema esquerda, aproveito para expressar a minha concordância com o post Negri é marxista?, do Miguel Madeira.
Apesar de não ser um "libertário benthaniano" e de não ter (feliz ou infelizmente) feridas para lamber junto de "esquerdistas", congratulo-me pelo menos com o facto de o Henrique Raposo conseguir retirar um "prazer absoluto" desse cenário imaginado. Pesem embora as possíveis conotações com a medição hedónica que a expressão utilizada pelo Henrique Raposo acarreta, aprecio genuinamente essa inclinação para retirar prazer das coisas simples. Bem haja pois, caro Henrique.
por André Azevedo Alves @ 1/27/2006 02:58:00 da tarde
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