Democracia: sem participação, não há representação
O Miguel Madeira escreve aqui um texto muito interessante, onde critica a minha ideia que a única forma de democracia segura é a representativa. O Miguel contrapõe-lhe a democracia participativa e deixa-se ir num equívoco que marca depois todo o seu raciocínio. Na verdade, até mesmo a democracia representativa é participativa, quanto mais não seja quando alguém se candidata e outros votam. Contraposto à democracia representativa está, pois, não a ideia de participação, mas a democracia directa.
A democracia não é todos podermos decidir a todo o instante sobre tudo. Isso é utopia. Democracia é ser-nos dada a possibilidade de escolher, para um período de tempo determinado, quem vai decidir sobre a vida em comunidade. Se o poder de decisão deverá incidir em muitas ou poucas áreas, isso já é tema para socialistas e liberais. O que interessa agora à discussão é que todos escolhemos. Todos nos podemos candidatar, mas apenas os que vencerem, governam durante determinado período de tempo, findo o qual se repetirá a eleição.
Naturalmente que a democracia não se cinge a isto. Exige a possibilidade de outro tipo de participação, como por exemplo o de escrever e ler blogues. No entanto, esse aspecto tem mais que ver com liberdade que com um qualquer conceito de democracia.
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Classificar a democracia como participação, tanto dos eleitores como dos candidatos, é muito importante. Senão vejamos: O Miguel refere que o regime soviético se aproximava do “desenho formal das democracias representativas”, porque, de 5 em 5 anos, se votava para o Soviete Supremo (isto nas constituições de Dezembro de 1936 e Outubro de 1977). No entanto, ao voto universal contrapunha-se uma lista única (como o Miguel, aliás, relembra e muito bem). Ora, de que vale poder votar se apenas existe um candidato ou uma lista de candidatos? É assim que, se é importante poder votar, a mais das vezes é indispensável a possibilidade de as pessoas se candidatarem.
Uma única nota chamando a atenção para que, nem sempre, nas democracias parlamentares, o poder legislativo é engolido pelo executivo. Um caso paradigmático é o britânico. Tal sucede, a meu ver, devido ao sistema uninominal de eleição dos deputados que lhes dá uma legitimidade directa e não totalmente dependente da vontade do líder partidário. Por essa razão, entendo que o parlamentarismo apenas pode funcionar nessas condições e a sua alternativa credível ser o sistema presidencial, onde existe verdadeira separação de poderes. Mas isso, como o Miguel naturalmente compreenderá, é matéria para outra polémica.
por André Abrantes Amaral @ 12/19/2005 11:52:00 da manhã
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