I'm outta here
(Acentos de teclado francês)
A discussão normal sobre a economia paralela e fuga fiscal tem variado entre duas visões: a académica e a ideologica (mais a segunda que a primeira é certo). Por exemplo: ja ouvi num debate, um representante da CGTP começar por falar de valores de dividas fiscais e evasão fiscal e acabar a discutir défices e numeros como se evasão e divida fossem a mesma coisa e a resolução das dividas fosse a solução para o problema das contas do estado. Oiço e leio também muita gente que discute numeros, percentagens e modelos sem separar o que é diferente embora numa perspectiva diversa da anterior e de forma técnica (sociologica ou outra). Ora não sendo economista ou sindicalista, este assunto atinge-me directamente, pelo que entendo que devo discutio-lo na sua vertente pratica, do dia a dia, mais que na académica ou ideologica que limitam-se a ser consequências e analises da anterior.
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Ha mais que um nivel na economia paralela:
A evasão das actividades criminosas/ilegais: trafico de droga, corrupção, contrabando, prostituição, etc;
A evasão nos pequenos negocios: sub-facturação, compras/vendas sem registo, etc;
A evasão nos negocios que envolvem o estado (onde incluo as autarquias).
Os três niveis têm motivações e consequências diferentes. No primeiro caso falamos de margens de lucro brutais que compensam largamente os riscos. Neste caso os lucros são normalmente introduzidos na economia legal através de lavagem de dinheiro, acabando a pagar impostos (embora inferiores ao que deviam ser) no consumo e rentabilidades dos investimentos em actividades legais.
No caso da evasão nos pequenos negocios, que esta longe de ser negligenciavel, a motivação assenta na pressão fiscal e nos fundamentos morais que suportam a fuga ao fisco. Assim é moralmente aceitavel para qualquer pequeno negocio fugir ao fisco, quando sabe que os partidos politicos gastam na campanha eleitoral autarquica de 2005 dez vezes mais que na de 2001 e tanto como em todas as campanhas desde 1976, sendo estes gastos maioritariamente pagos pelos impostos. Ou quando sabe que o que paga serve para o estado gastar 65% em si mesmo e que este lhes presta um serviço cuja qualidade esta longe de justificar o preço. Mais ainda, os pequenos negocios que lidam com mercadorias, de acordo com o sistema fiscal, são obrigados a pagar impostos (IRC) não sobre o seu rendimento real (dinheiro ganho) mas sobre a soma do dinheiro ganho + variação de stocks, pereciveis, vendaveis ou não. Assim, uma mercearia que tenha prejuizo na conta bancaria, pode ter que pagar IRC porque a variação de stock é positiva. Isto por si so é ou não uma razão moral valida para fugir aos impostos? Para ajudar a tudo isto, a Justiça e a burocracia estatal não permitem gerir em tempo util (como nos casos das dividas de clientes e dos stocks de bens pereciveis/invendaveis). Neste nivel a colaboração de todos é notoria. Não adianta dizer que os trabalhadores por conta de outrém não têm por onde fugir. É mentira. Seria verdade se o unico imposto fosse uma flat tax de IRS e mesmo assim se considerarmos subsidios de refeição, assistência medica gratuita, ajudas de custo, creches pagas pela empresa, etc, etc; fogem tanto como as empresas que lhes pagam o salario.
O terceiro nivel parece-me ainda mais grave que o primeiro, porque ao contrario deste e do segundo diz respeito a meios que não pertencem a nenhum dos intervenientes e relaciona-se com anteriores por mais duas razões: é actividade tão criminosa como o trafico com a agravante de usar dinheiro de terceiros e não tem nenhuma razão moral que a suporte. Supondo (sem fazer nenhum julgamento) que são verdade as historias que se contam àcerca dos negocios camararios com terrenos e afins, de onde vem o dinheiro que enriquece os autarcas? Não é dinheiro privado como no caso do trafico e contrabando. São meios publicos com origem nos impostos pagos pelos privados. Ou seja é uma fuga/crime dupla e a mais danosa das três consideradas, porque retira meios a terceiros sem o acordo destes, meios esses que eventualmente podem ser aplicados no primeiro ou no segundo niveis. Ou seja falamos de duplo roubo puro e simples. É como se alguém entrasse em nossa casa e nos roubasse parte substancial do que possuimos depois de lhe pagarmos uma enormidade. Mais grave ainda é que são os envolvidos neste terceiro nivel da economia paralela que escrevem e aprovam a leis com que se regem a eles proprios. Assim é facil.
por Helder Ferreira @ 10/08/2005 08:28:00 da tarde
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