29.9.05

Uma questão de respeito

Eu viciei-me nos debates autárquicos da Sic Notícias e da TSF. Eu, confesso, sou um pervertido, que goza ante o espectáculo da miséria humana. Eu rio-me das fatiotas, sugeridas por ‘assessores’ que no expediente são seguranças de boîte. Eu rio-me das atitudes, que pretendem emular estadistas e resultam na absoluta emulação do patético. Eu rio-me das frases, maravilhosamente ocas e decoradas a custo para desarmar o adversário (“Ó sr. dr., não fique nervoso!”). Eu rio-me de um país que chegou a isto e que se calhar nunca disto terá saído. E depois rio-me de mim, por contemplar semelhante miséria sem um pingo de vergonha ou de esperança.

Trata-se, porém, do abismo autárquico, cuja essência é irreformável. O problema é que as próprias ‘presidenciais’ não prometem melhor. Dos caciques de província à ‘alta política’ vai um saltinho, que aliás as reacções à divertida candidatura de Manuel Alegre exemplificam. Jerónimo garante ir até ao fim, o que no PCP basta para constituir uma epopeia. O dr. Louçã acha que Alegre não possui a “raiva” (sic) necessária para combater a direita – se não tivesse Louçã, o Bloco com certeza recolheria o seu candidato num canil. E o dr. Soares, coitado, permanece no risonho mundo de 1986, entre a audácia de Zenha, as reviravoltas nas sondagens e uma esquerda fragmentada prestes a beatificá-lo.

Sobra evidentemente Cavaco, o dos silêncios, das estratégias e das ‘gestões’. E face à concorrência, Cavaco parece ser o mal menor na desesperada corrida a um cargo que ninguém sabe para que serve e ninguém concorda sobre para que deveria servir. Ao menos, a utilidade de um presidente de câmara não levanta quaisquer dúvidas. Perguntem em Felgueiras. Perguntem onde quiserem.